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sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Após 2 anos, Laurinha ainda não acordou - by O Estado


Há dois anos, o Ceará parou em orações pedindo pela vida da pequena Laurinha. Amanhã, ela completa mais um ano de vida.
Cercada pelos cuidados e carinho da família, sua história já rompeu as fronteiras do Estado e do País na campanha das redes sociais “Acorda, Laurinha!”, que conta com 107 mil seguidores. De acordo com a avó materna, Julita Teixeira, as mensagens e orações ajudam a família a superar as dificuldades. “As pessoas mandam mensagens lindas, orações, e é isso que nos fortalece. A existência dessas pessoas é essencial na nossa vida e na da Laura”, disse Julita.
_SUGESTÃO_Acorda Laurinha.NAYANA MELO (50)
O pai, Ádamo Cruz, explica que Laurinha já saiu do coma, mas ainda não acordou. A pequena respira com ajuda de aparelhos e se alimenta por sonda em uma UTI montada no apartamento da avó. Diariamente, passa por atividades como fisioterapia, fonoaudiologia, terapia ocupacional e por um tipo de tratamento que busca reabilitar o sistema nervoso da paciente. Segundo Ádamo, os tratamentos têm surtido efeitos. Mesmo que lentos, despertam a esperança na família de um dia Laurinha consiga viver mais independente. “O quadro clínico dela é estável, mas tem evoluído lentamente. Percebemos quando ela chora pela expressão do rosto, reage a estímulos e abre os olhos devagar, mas mantém a visão estática”. Toda evolução, mesmo que seja pouca, já desperta na família uma nova esperança de melhora. “Temos fé. O futuro só Deus quem sabe”, falou a avó.
Uma equipe de enfermagem a acompanha 24 horas, além da atenção de seis médicos especialistas como pediatra, neurologista e ortopedista. “O serviço de UTI é fornecido pelo plano de saúde, mas ele não cobre as despesas como a consulta dos médicos e alguns exames, por exemplo. Esses saem do nosso bolso”, explicou o pai. A avó Julita dedica-se integralmente aos cuidados à neta. “Infelizmente, não existe um remédio que cure a minha neta. O que poderia ter sido feito não aconteceu há dois anos, no nascimento dela. Ela vive a base de estímulos. Oferecemos a ela tudo que podemos. A Laura é uma sobrevivente de um erro médico. Éramos para estar com minha filha, todos juntos, para comemorar o aniversário da Laurinha, mas isso não vai acontecer”, contou Julita.
O que ocorreu?
Há dois anos, Paula Teixeira chegava saudável à Maternidade Gastroclínica, onde daria à luz a Laurinha. Porém, após tomar um medicamento, Paula sofreu um choque anafilático e não resistiu. “Paula estava bem, arrumando o quarto com as lembrancinhas, antes de ir para a sala de parto. Logo após tomar a injeção, começou a passar mal”, recorda Ádamo.
Paula sofreu oito paradas cardíacas e não resistiu. Em razão disso, Laurinha não recebeu o oxigênio da mãe, por isso adquiriu paralisia cerebral no parto. A menina nasceu com morte aparente, sem respirar e com a cor escura. Após ser entubada, ela ganhou a cor normal e passou a respirar com a ajuda de aparelhos, como está até hoje.
Segundo a família, Paula queria fazer um parto natural, mas Ádamo Cruz diz que o médico obstetra, no decorrer do pré-natal, foi incutindo a realização de um parto cesariano. Ele alegava que a paciente tinha engordado muito, estava com pressão alta e sua gravidez era de risco. O que Ádamo contesta: “Como ela teria gravidez de risco se trabalhou até a véspera do parto?” Conforme ele, o médico pediu vários exames sobre o estado de saúde da paciente para justificar a cobrança de R$ 1.740 mil por procedimentos extraordinários ao serviço, além das taxas normais já pagas pela família ao plano de saúde da paciente.
Relato
“O médico que iria fazer o parto antecipou o procedimento para adequar a uma viagem que ele tinha. Ele prescreveu uma medicação profilática para antes do parto, o que era para ter sido feito após. Além disso, ele instruiu a técnica de enfermagem por telefone para que, enquanto ele fosse chegando, ela fosse aplicando a medicação. Foi nesse momento que tudo aconteceu. Depois disso, partiu para o erro do outro médico, que era plantonista otorrino. Ele demorou a socorrer e, quando chegou, não identificou a reação que ela teve. Foi dando uma droga atrás da outra tentando ver qual delas revertia o caso. Quando ele viu que não daria certo, ele desceu para a UTI, mas já era tarde. Foram mais de 20 minutos na transferência do quarto para a UTI, onde o parto foi realizado”, relatou Ádamo, acrescentando que Laura nasceu por ajuda de uma obstetra que se prontificou a tomar a frente. “Casualmente, tinha uma obstetra que estava dando alta a uma paciente e viu a situação e, por conta e risco dela, pediu o material de cirurgia, seguiu o protocolo médico de tentar reanimar a Paula; como não conseguiu, fez o corte a frio na tentativa de salvar o bebê”.
Para o pai, Laurinha é um milagre. “Ela é uma vitoriosa. Ela aguentou tudo o que a mãe sofreu, pois ela ainda estava dentro da barriga quando tudo aconteceu. Um adulto não aguenta e, por ela ser um neném, acreditamos que ela sobreviveu por um milagre”, falou Ádamo.
Inconformada, Julita lamenta o caso. “Minha filha não morreu de parto e sim de erro médico. O hospital não deu assistência. Ela não teve a alegria de ver a filha. Deram o medicamento errado, na hora errada e da forma errada. Eu vi tudo. Até o momento que ela se foi, ela era a pessoa mais saudável e feliz”, contou a mãe de Paula, emocionada.
O laudo cadavérico de Paula apresenta como causa da morte “choque anafilático devido a efeito adverso de droga ou medicamento correto e administrado de maneira apropriada”.
Sem resposta
A reportagem entrou em contato com o Hospital e Maternidade Gastroclínica. Em nota, a assessoria de comunicação informou que “não pode se pronunciar, no momento, sobre o caso da Laurinha porque aguarda decisão da Justiça”. O hospital se defendeu afirmando que “sempre colaborou com as informações referentes ao caso. Nosso maior compromisso é com a qualidade da assistência prestada aos nossos pacientes, em uma relação de confiança que tem bases sólidas na ética e na transparência”.
Justiça
A luta da família, agora, é em busca de justiça. O pai de Laurinha defende a teoria que a demora no atendimento para Paula causou a sua morte e a demora na decisão de fazer o parto custou a vida da mãe e causou as sequelas na filha. “Alguém tem que se responsabilizar por isso”, afirmou.
Em entrevista ao jornal O Estado, Ádamo Cruz conta, ainda, que recebeu denúncias de que a mesma negligência a qual Paula passou outras pessoas também enfrentaram. “Várias pessoas vieram até mim e disseram que já passaram pela mão do cara, que não divulgamos o nome porque o processo corre em segredo de Justiça. Elas relataram que ele cometeu erros nos procedimentos, de prescrição de conduta desnecessária. Uns oito são casos semelhantes ao nosso. Isso é muito para uma pessoa que continua exercendo a profissão”.
Ao todo, a família entrou com três processos na Justiça. Dois contra os médicos que, possivelmente, fizeram os procedimentos errados, e outro contra o hospital. O inquérito, aberto em maio de 2014, corre em segredo de Justiça e investiga os possíveis responsáveis pela morte de Paula e a quase morte da criança. Dois anos depois, o caso continua sem resolução. A família e os amigos aguardam por muitas respostas que não foram dadas.
Uma audiência será realizada no dia 16 de fevereiro. “A nossa advogada disse que seria conciliatória, mas não disse detalhes. Vou de peito aberto para ver o que vou encarar”, disse Ádamo.
Missa
Para celebrar os dois anos de Laurinha, amanhã, às 20 horas, será celebrada uma missa no Lar Amigos de Jesus, no bairro Joaquim Távora, em Fortaleza. “Éramos para estar celebrando a vida de Laurinha de uma outra forma. Mas, mesmo assim, não vamos passar em branco”, finalizou a avó.
CAMILA VASCONCELOS
Da Redação

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