Fundo Carolina, criado pelo poeta Talles Azigon, financia novos livros
Iniciativa de escritor cearense propõe união de investidores interessados em dar vida a projetos literários de autores que não têm como bancar publicações. Primeiro livro da ação será lançado em junho e outros dois títulos sairão ainda este ano
Carolina Maria de Jesus (1914 - 1977) era negra, morava na Favela do Canindé, em São Paulo, e tirava sustento de um lixão. Aproximando-se da literatura por meio dos livros que achava e levava ao seu barraco, ela encontrou na realidade em que vivia a base para sua própria produção literária. Na década de 1960, seu livro Quarto de Despejo, que ficou conhecido após ser “revelado” pelo jornalista Audálio Dantas, se tornou um fenômeno editorial e midiático, sendo publicado em mais de 40 países. A trajetória dessa mulher inspira o nome do projeto Fundo Carolina, idealizado pelo poeta e produtor cultural Talles Azigon. A tese do escritor cearense é simples e pulsante: existem “outros Quarto de Despejo” engavetados que precisam chegar ao público, mas seus autores não têm verba para publicar.
“Como editor da Substânsia, fui vendo que a gente recebia muitos originais e projetos de livros interessantes, mas que as pessoas não tinham dinheiro para entrar com a coparticipação. Isso me deixava angustiado”, conta Talles, um dos fundadores da editora cearense que há três anos tem forte atuação na Capital. A partir desse desconforto, ele pensou na possibilidade de montar um fundo para custear escritores. A ideia agora ganha forma e o primeiro livro lançado pelo Carolina, a obra Claviculário, da escritora Anna K, chega ao público este mês, no dia 21, em local ainda a ser definido.
Para dar o pontapé, Talles vem tirando do próprio bolso. “De todas as atividades que realizo como produtor, editor e poeta, estou tirando uma porcentagem para o Fundo”, conta. A partir desse trabalho de formiguinha, ele já garantiu a publicação de outros dois projetos, o Boca de cachorro louco, de Kah Dantas, e uma antologia do Projeto Leitura Escambau, que realiza concursos de microcontos no Facebook. Os vencedores da terceira edição do prêmio poderão ser incluídos no livro. O objetivo é que o Fundo possa reunir mais gente interessada em viabilizar novos projetos literários. “A ideia é o financiamento colaborativo continuado, é buscar gente que se proponha a ajudar. Tem muita gente que tem recurso e pode ajudar”, confia.
“O que o Talles está fazendo é pegar o pouco que tem e investindo para fazer circular a palavra. Esse fundo é a prova de que não precisa de muita coisa para fazer um projeto ganhar o mundo. Precisa ser honesto e acreditar”, aponta Anna K, que vem desenvolvendo o Claviculário há dez anos e não tinha conseguido lançar a obra. Ela afirma acreditar que essa iniciativa vai render frutos justamente porque está associado ao movimento de união de articuladores da literatura na Capital. “Com os saraus e os clubes de leitura, tenho notado que há uma aproximação maior (entre autores). Principalmente nas periferias. Gente que não conseguiu se publicar está se encontrando e vendo que é possível realizar essa troca”, comemora a escritora.
Wilson Júnior, escritor e editor do site escambau.org, faz coro. “É de suma importância que escritores se organizem dessa forma. A gente sofre no Brasil uma carência de público que reflete na dificuldade de achar espaços de publicação. Quando a gente se agrega para pensar saídas, a literatura se fortalece”, celebra. Para ele, o Fundo surge como uma nova possibilidade “Muitos escritores na história da literatura só foram reconhecidos de maneira póstuma, porque não tinham como publicar. Hoje, é cada vez mais difícil para as editoras custear por inteiro novos autores, o Fundo vem como essa fresta para a gente acreditar e se unir”.
SERVIÇO
Para entrar em contato com o Fundo Carolina
Email: tallesazigon@gmail.com
Facebook: facebook.com/fundocarolina
Instagram: @fundocarolina
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